sexta-feira, 22 de agosto de 2014

Pensata #2

Da relação do teatro com a liberdade

Se eu pudesse ser o outro, libertar-me de ser só eu mesmo, todos os objetos que eu tomo deixando de se referir a mim, sendo incorporados pelos minutos. Se eu pudesse tomar os objetos pelo prazer do deslocamento e da construção. Entrarei em contato com a criação da vida: tomarei este livro para ser outro; serei o funcionário ultra-disposto, atuando, vendo os personagens girando, libertando; irei para o bar desconhecido onde saciarei desejos desconhecidos; darei um outro rosto a mim mesmo, onde me verei. Então entenderei o que é ser Vida em outra Vida. Não serei eu que morrerá: será um outro. Eu mesmo continuarei.

quarta-feira, 20 de agosto de 2014

Pensata #1

Se um quadro com uma bola disforme no centro em uma composição com pouquíssimos elementos é uma obra de arte pertencente a um autor universalmente respeitado, se se vê ali um estilo, completo em si, único, uma afirmação artística arrebatadora, por que, ao se ouvir uma música baseada em 3 acordes, frequentemente músicos inteligentes atentam apenas para a ausência de outros rumos da harmonia?

Em um quadro como esse é como se escolhessem expressar pelo discurso o estarem vendo apenas uma bola perfeitamente redonda, um retângulo azul abaixo, um fundo sujo creme e branco e rabiscos completamente aleatórios nas laterais. Nenhuma aceitação da experiência estética, nenhum mundo alusivo, nenhuma loucura bela, nenhuma voz absolutamente particular e nenhum vazio proposital, nenhuma ironia, nenhuma acidez em repetir a tua, a minha, a nossa roda.


Assim é a compreensão de vários músicos acerca da "pobreza musical" de, por exemplo, o rock, a música popular e a pop baseados em poucos acordes e pouco arranjo. 

É como se, grosso modo, não se conformassem que uma comida como o sushi fosse crua. E tentassem nos convencer de que para todos os casos e situações a comida assada fosse a melhor, a mais saudável, a mais asseguradamente digna do adjetivo"inteligente".

Por estarem querendo dizer outra coisa, esquecem completamente do fato de que toda expressão artística é de saída abstrata.Compõem então juízos críticos a partir da alienação ante a esse aspecto mais básico da obra de arte.

(Acima o quadro Sol Vermelho de Miró)




Texto sobre rock publicado no Whiplash

O site Whiplash publicou uma análise da música For your life do Led Zeppelin que gostei muito de escrever.

Segue o link:

http://whiplash.net/materias/biografias/206432-ledzeppelin.html

quinta-feira, 14 de agosto de 2014

Trio Pestana



Não é por não contar com um cantor/frontman que a música instrumental  perde suas possibilidades infinitas e que deixa de privilegiar, entre outros elementos, a diversão, qualquer que seja o ambiente em que se esteja.

O posicionamento dos músicos em relação a que espaço querem ocupar numa apresentação ou que espécie de impressão querem causar é que decide como será partilhada a quota de alegria e acréscimo entre músicos e plateia.

A minha aposta é a de que a espontaneidade e a abertura do Trio Pestana são tão grandes, tão claro é o seu espírito de interação e tão evidente sua musicalidade que você jamais se sentirá entediado em seus shows como acaba acontecendo em alguns casos de música instrumental na noite.

Muito pelo contrário: a diversidade do material escolhido (músicas conhecidas selecionadas de vários gêneros) somada à pegada própria da banda transmitem a sensação de um jogo constante entre músicos e público, como se no próprio som houvesse convite, ironia  e aquela discrição aberta, como em um flerte.

Não estou querendo com estas linhas tirar mérito nenhum das gigs de música instrumental que prezem por seriedade, explosão multi-técnica e concentração na tradição e raízes de algum gênero (o bebop ou a escola Hermeto Pascoal, por exemplo). Mas não esconderei que sou da opinião de que muitas vezes o gênero música instrumental perde com a completa falta de pensamentos realmente abertos em torno do que tem apelo e é informação clara para a plateia.

O Trio Pestana é uma banda formada este ano em Curitiba por 3 jovens amantes de música (Mateus Azevedo, Maurício Escher e Anderson de Lima) e em seu show você ouvirá Take Five (standard de jazz composta por Dave Brubeck), Wicked World (do Black Sabbath),  Milionário (aquela mesmo, famosa na versão dos Incríveis) e Maria Fumaça (Banda Black Rio) tocadas com a mesma naturalidade. Saí do primeiro show que vi com a impressão forte de surpresa refletida na pergunta: “por que mais bandas não pensam assim?”

Existem grandes artistas cuja sacada está em um quase sair de cena fazendo com que, entre outras coisas, seja colocado em cheque aquele sentimento, bastante comum na classe artística, de dever natural de ocupar espaço ou "quanto mais melhor". Este é evidentemente o caso desta iniciante grande banda chamada Trio Pestana.

O trio tocando Maria Fumaça: